A guerra tarifária que foi iniciada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, deverá ser um dos principais temas nas discussões da reunião de chanceleres do Brics, que ocorre no Rio de Janeiro. O documento final deve incluir críticas a “medidas unilaterais”.
“O objetivo dos ministros é negociar uma declaração que reafirme a centralidade e a importância do sistema multilateral de comércio, destacando as negociações comerciais multilaterais como o foco principal de atuação nessa área”, afirmou o embaixador Maurício Lyrio, negociador brasileiro no bloco. “Eles também devem reiterar, como sempre fizeram em declarações anteriores, sua oposição a medidas unilaterais, independentemente da origem. Essa é uma posição histórica dos países do Brics.”
Vale lembrar que o Brics já foi alvo de críticas por parte de Trump, que chegou a ameaçar impor tarifas de 100% a todos os países do grupo caso decidam criar uma moeda única para transações comerciais que substituísse o dólar. Na verdade, conforme reportado pela Reuters, a discussão gira em torno do aumento do uso de moedas locais e da interconexão dos sistemas de pagamento entre os países para facilitar o comércio.
Cada um dos membros do Brics — atualmente 11, com a adesão do Egito, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã aos já existentes Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul desde o ano passado — enfrenta desafios distintos em meio à guerra comercial iniciada pelo governo norte-americano. A China, sendo a maior economia do grupo, é a mais diretamente afetada, com tarifas de 145% sobre suas exportações destinadas aos EUA.
Embora o Brasil esteja entre os países com tarifas mais baixas, fixadas em 10%, ele enfrenta uma sobretaxa de 25% sobre as exportações de aço e alumínio.
A defesa do multilateralismo, que tem sido uma constante nos discursos do Brasil e da China, tem enfrentado sérios obstáculos devido à ausência de arbitragem internacional no comércio. Isso se deve à paralisia da Organização Mundial do Comércio (OMC) desde 2017, quando os Estados Unidos deixaram de nomear novos juízes para o órgão de apelação, responsável por decidir sobre violações às regras comerciais internacionais. Essa situação resultou em um déficit no quórum necessário de três juízes para a formação de decisões.
Em relação às tarifas impostas pelos EUA, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já declarou que o governo brasileiro recorrerá à OMC caso as negociações diretas com os Estados Unidos não resultem em uma solução satisfatória. No entanto, a administração brasileira é consciente de que essa ação pode ser vista mais como um procedimento formal do que uma expectativa real de sucesso.
“O Brasil já participou de painéis e obteve vitórias em alguns casos, mas a tendência é que os países que perdem recorram a apelações, embora isso muitas vezes seja em vão. Eles apelam para um órgão de apelação que está inoperante. Isso, sem dúvida, prejudica o sistema multilateral ao privá-lo de uma ferramenta essencial para resolver disputas”, afirmou Lyrio, que também atua como negociador do Brasil nas questões tarifárias com os Estados Unidos.